sábado, 21 de maio de 2011

Educação em Luto


Como em todos os dias, hoje levantei ás 6h00 da manhã e me arrumei para levar o meu filho até a escola e enquanto vestia meu pequeno fiquei pensando nas mães das vitímas de Realengo que nunca mais vão se irritar com as crianças que nunca querem acordar, nunca mais caminharam até a porta da escola com seus filhos, ou até mesmo, nunca mais tomaram juntos o café da manhã apressado de quem se despede do filho enquanto eles entram na perua escolar.
Desde a decáda de 30, a imagem que a educação tenta nos vender é a de que sem educação não há futuro, pois somente atráves dela podemos mudar o rumo de nossas vidas. Mas, afinal, que educação estamos dando as nossas crianças e jovens que faz com que um caso tão barbáro ocorra em um país que até então nunca tinha vivenciado episódio tão tenebroso?
O jovem que cometeu tal ato insano sempre foi visto como um excelente aluno dentro da escola, talvez seja esse o primeiro erro do sistema, que ao se deparar com o dito "bom aluno" nunca presta atenção em suas reais necessidades, isso porque na educação ainda se acredita que o importante é desenvolver o lado cognitivo (saberes) deixando de lado tudo que possa parecer mais humano que o bom desempenho escolar.
Além disso as vítimas, em sua maioria, foram meninas, fato que não pode ser visto como casual e sim como premeditação, fazendo com que esse crime se transforma-se não apenas em uma fatalidade, antes acabou virando mais um crime contra a mulher, essa que lutou tanto para ter acesso a educação ao longo da história. Esse é o retrato de uma sociedade patriarcal e machista que faz com que meninas se transformem em mulheres cada dia mais cedo, que ensina as mesmas a criarem seus filhos homens dentro da lógica patriarcal e que marca a mulher com o eterno estigma do desejo pelo corpo feminino.
Sou solidária as lágrimas derramadas pela nossa presidenta Dilma Rousseff, que diante da fatalidade, em seu pronunciamente pediu por um minuto de silêncio e neste minuto deixou que as lágrimas tomassem conta de seus olhos. Isso ocorreu não somente pela sensibilidade feminina, mas antes porque ela, como um símbolo de vitória e conquista feminina, conseguiu ver o quão longe estamos de realmente nos livrar dessa herança patriarcal que faz com que a mulher se transforme em "coisa" não em um ser dotado de capacidade e inteligência para além da adiministração do lar e trato dos filhos. Sem querer levantar bandeiras partidárias, pois antes da figura me remeto a mulher que todos esquecem que existe para além da figura da autoridade de Dilma.
Não bastasse todos esses aspectos do crime, em meio as redes sociais o que mais houve foram afirmações preconceituosas vindas de pessoas que afirmavam que fatores religiosos influenciaram no atentado, alguns até cogitaram a hipótese do jovem ser adepto da religião muçulmana por causa das afirmações de alguns detalhes de sua carta suicida. Mas uma vez uma fatalidade foi utilizada para desencadear o preconceito velado de tantos, pois como poderia essa afirmação ser verdadeira quando a carta leva os nomes de Deus e Jesus? As pessoas tendem a aproveitar situações de crise para declarar seus preconceitos sem precedente.
A idéia do jovem certamente foi importada e inspirada no caso de COLUMBINE, contudo não é saudável globalizarmos também as paranóias e medos estrangeiros, afinal, nossa realidade é diferente e precisa ser analisada pela ótica da análise da sociedade brasileira e não do preconceito estrangeiro.
Outra afirmação que me deixou um tanto conturbada foi a de como o rapaz não tinha amigos e passava o tempo inteiro recluso em frente ao computador. Não podemos culpar a tecnologia e os meios de comunicação pela criação de tipicos sociopatas, antes temos que analisar o porque estamos deixando uma invenção que foi criada para ajudar o homem transformar as pessoas em máquinas que possuem duas vidas, uma no mundo real e outra nesse universo paralelo onde podemos, se desejarmos, nos transformar até mesmo em Deuses que ficam fatalmente marcados e chocados quando são atirados para viver em meio ao mundo real.
Crimes como o que ocorreu em Realengo me fazem sofrer como educadora, mãe e mulher que sou. Me fazem temer ao pensar no mundo que estamos criando para os nossos filhos e para as próximas gerações.
Para terminar esse texto deixo aqui um trecho do livro Educação e Emancipação, que relata um entrevista de um dos Filósofos da Escola de Frankfurt Theodor W. Adorno, que fala sobre a Educação após Auschwitz (campo de concentração Alemão). Como alemão e judeu fa uma reflexão sobre o que temos que fazer para evitar tal atrocidade, e mesmo para aqueles que não pertencem a área da educação cabe compartilhar tal reflexão que tem um forte apelo a todo e qualquer ser humano:

"...se as pessoas não fossem profundamente indiferentes em relação ao que acontece com todas as outras, excetuando o punhado com que mantêm vínculos estreitos e possivelmente por intermédio de alguns interesses concretos, então Auschwitzs não teria sido possível, as pessoas não o teriam aceito''. (ADORNO,p.134)

Em outras palavras, não é hora de apenas lamentar pelo o que aconteceu, antes é hora de lutarmos para que esse tipo de evento não aconteça nunca mais em nosso país.

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